[forum-prof] um aborto é igual ao outro, by Mainardi

LuizEduardo2 luizeduardo2 at infolink.com.br
Sat Sep 6 15:02:26 BRT 2008


VEJA
Edição 2077
10 setembro 2008




Diogo Mainardi
Um aborto é igual ao outro

"O aborto é uma escolha puramente pessoal. O que
é moralmente repugnante é o conceito de que alguns
merecem ser abortados mais do que outros"

Sarah Palin, no congresso do Partido Republicano, 
prometeu que, se eleita, assumirá o papel de 
patrona das pessoas com necessidades especiais. 
Um Santo Egídio na Casa Branca. Um Santo Egídio de batom.

O recém-nascido de Sarah Palin é Down. Seu nome é 
Trig. Trig rapidamente se tornou uma das 
principais bandeiras da campanha presidencial 
americana. Ele é agitado de um lado para o outro, 
passando de colo em colo, de palco em palco. 
Sarah Palin descobriu que Trig era portador de 
síndrome de Down durante a gravidez. Em vez de 
abortá-lo, foi adiante com a gravidez mesmo assim.

Sarah Palin é contrária ao aborto. Me incomoda um 
tantinho que seus partidários e opositores sempre 
associem Trig a esse fato. Ter a síndrome de Down 
parece qualificá-lo automaticamente para um 
aborto. Os partidários de Sarah Palin interpretam 
a escolha de ter parido Trig como um sinal de 
grandeza. Seus opositores a interpretam como um 
sinal de obtusidade religiosa. Mas abortar Trig 
teria sido igual a abortar Track, ou Bristol, ou 
Piper, ou Willow. Um aborto é igual ao outro.

Eu entendo do assunto. Tenho dois filhos. Como 
Sarah Palin, agito-os de um lado para o outro, de 
artigo em artigo. Ela tem Track e Trig, eu tenho 
Tito e Nico. Tito passou por todos os testes 
pré-natais. Naquele tempo, eu era um palerma, e o 
teria abortado até mesmo se seu ultra-som 
mostrasse algo simples como um pé chato. Na hora 
do parto, devido a uma barbeiragem médica, Tito 
sofreu uma paralisia cerebral. Isso mudou tudo. 
Eu mudei. Quando decidimos ter outro filho – Nico 
–, perguntei-me se o abortaria caso os testes 
pré-natais indicassem alguma anomalia, por mais 
séria que fosse. A resposta: jamais. Jamais? Jamais.

Do Alasca para a Inglaterra. David Cameron, líder 
do Partido Conservador, tem um filho com 
paralisia cerebral. Seu nome é Ivan. Como Sarah 
Palin e eu, David Cameron agita Ivan de um lado 
para o outro, de reportagem em reportagem. Ele 
argumenta que seu caso pessoal pode ajudar a 
esclarecer algumas de suas idéias políticas. Ao 
contrário da maioria de seus correligionários, 
ele defende a liberdade de abortar até a 39ª 
semana de gravidez, em caso de fetos defeituosos, 
e só até a vigésima semana, em caso de fetos sem 
defeitos. Ele está disposto a estabelecer – por 
lei – uma disparidade hedionda.

O nazismo matou mais de 70 000 deficientes 
físicos e mentais nas câmaras de gás. Os 
princípios da SS vingaram. Agora os testes 
pré-natais permitem determinar quem pode viver e 
quem pode morrer. É um Aktion 14F13 intra-uterino.

O aborto é uma escolha puramente pessoal. Todos 
deveriam ser livres para fazer o que bem 
entendem. É uma estupidez legislar demais sobre o 
tema. O STF, em meio aos grampos, julga os casos 
de aborto de anencéfalos, mas o fato é que, no 
Brasil, qualquer um que queira abortar, aborta, 
na vigésima ou na 39ª semana de gravidez. O que é 
moralmente repugnante é o conceito de que alguns 
merecem ser abortados mais do que outros. Trig. Tito. Ivan.


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