[forum-prof] Deforma Universitária - Roberto Macedo

Prof. Luiz Eduardo luizeduardo at pharma.ufrj.br
Thu Jan 27 23:51:36 BRST 2005


><http://estado.com.br/editorias/2005/01/27/aberto050127.html>ESPAÇO ABERTO 
><http://estado.com.br/editorias/2005/01/27/capa050127.html>O ESTADO DE S.PAULO
>27 de janeiro de 2005
>
>Deforma universitária
>
>Roberto Macedo
>
>Meu dicionário tem reforma e reformação como sinônimos. Tem também 
>deformação e poderia ter o substantivo deforma pelo recurso lingüístico de 
>criar palavras adicionando prefixo a uma já existente. Prefiro deforma 
>porque soa melhor em oposição a reforma. Serve também para enfatizar que a 
>diferença entre uma coisa e outra aparentemente pode ser pequena, mas 
>enorme no seu significado.
>
>Refiro-me ao projeto de reforma universitária do Ministério da Educação 
>(MEC), que levará, se infelizmente aprovado e sancionado como se encontra, 
>a uma deforma das instituições de ensino superior (IES) naquilo que lhes é 
>vital, a forma de gestão.
>
>Em todo o documento permeia a idéia de gestão "democrática e colegiada". 
>Nessa linha, nas universidades federais se impõe a escolha do reitor e do 
>vice-reitor mediante eleição direta pela comunidade universitária.
>
>Ora, num raciocínio que não cabe numa comunidade desse tipo, que se diz 
>pensante, prevalece em segmentos dela, com alcance em outros círculos, a 
>crença de que esse processo é democrático. Entretanto, uma autêntica 
>democracia se sustenta no preceito de que todo o poder emana do povo e em 
>seu nome será exercido. O presidente Lula foi assim eleito, mas com essa 
>democracia universitária ele e/ou seu ministro da Educação seriam 
>impedidos de ter qualquer influência na escolha - digamos, de uma lista 
>tríplice de candidatos - dos dirigentes de instituições que integram o 
>Poder Executivo federal.
>
>Que democracia é essa que se quer exercida isoladamente na universidade, 
>sem dar satisfações à sociedade em geral? Deveria assumir o nome que 
>merece, o de corporativismo explícito.
>
>No processo, também não há preocupação com a eficácia e a eficiência. Se 
>existisse, uma autêntica reforma deveria abrir caminhos para escolha de 
>executivos competentes, e não de muitos que se elegerão a partir de 
>compromissos corporativistas com um colégio eleitoral em que se misturarão 
>professores, alunos e funcionários.
>
>Ao lado do reitor e dos pró-reitores, na cúpula das universidades 
>usualmente têm grande papel os Conselhos Universitários. Na USP, nele 
>predominam os diretores e outros representantes das várias faculdades. 
>Pelo projeto, viria um novo Conselho, o Comunitário Social (CCS), para 
>"... assegurar a participação da sociedade em assuntos relativos ao 
>ensino, à pesquisa, à administração e ao planejamento da universidade...", 
>com várias prerrogativas listadas em cinco itens, constituído pelo reitor 
>"... e, sempre com participação majoritária, por representantes de 
>entidades de fomento científico e tecnológico, entidades corporativas, 
>associações de classe, sindicatos e da sociedade civil".
>
>Ora, para que mais um conselho a emperrar ainda mais processos decisórios 
>já tradicionalmente marcados pela lentidão? Por que não integrar alguns 
>desses representantes nos Conselhos Universitários, nos quais igualmente 
>poderiam dar seus palpites e captar o que lá dentro se passa para os 
>segmentos que representam?
>
>Noutra carência que não faz justiça ao adjetivo universitária, propostas 
>como essas não se sustentam em nenhuma evidência científica de que tal 
>modelo de gestão "democrática e colegiada", na forma em que é mal 
>entendido aqui, seja um paradigma de eficácia e eficiência em outras 
>universidades, em particular as de maior prestígio mundial. Como até sua 
>teoria é falha, pois não é democrático e é pouco provável que reitores 
>assim eleitos e mais esse conselho levem a uma gestão melhor, há sérias 
>razões para se temer pelos resultados deformadores do projeto.
>
>A se disseminarem essas distorções, para avaliar seus resultados seria 
>interessante comparar tal forma de gestão com outras diferentes e 
>praticadas também no próprio País, se várias outras IES tivessem liberdade 
>para escolher alternativas. Mas, não. Em particular, o projeto estende às 
>IES privadas a mesma camisa-de-força de gestão "democrática e colegiada", 
>numa violência à iniciativa e à natureza não-governamental dessas 
>instituições. Assim, estabelece que nas universidades e nos centros 
>universitários privados pelo menos um de seus dirigentes, no nível de 
>pró-reitor ou equivalente, também será escolhido mediante eleição direta 
>pela respectiva comunidade. Além disso, todas as IES privadas serão 
>obrigadas a ter um conselho superior (mais o CCS, se forem universidades) 
>responsável pela elaboração das normas e diretrizes 
>acadêmico-administrativas com participação de representantes docentes, 
>discentes, funcionários e da comunidade, no qual os integrantes da 
>entidade mantenedora da IES privada e os exclusivamente administradores 
>desta não poderão exceder 30% da representação total.
>
>No projeto há vários outros absurdos em termos das boas práticas de 
>gestão, como os privilégios orçamentários conferidos às universidades 
>federais sem contrapartida de desempenho; as novas exigências exigidas das 
>IES privadas que sobrecarregarão a estrutura administrativa do MEC, 
>colocando mais dificuldades e ampliando o "mercado de facilidades"; nas 
>IES federais, a isonomia salarial nacional de docentes e servidores e a 
>absurda forma de contratação de alunos instrutores ou monitores, na forma 
>de primeiro emprego, apenas entre os alunos de famílias mais pobres; e por 
>aí afora.
>
>São muitos os aspectos vulneráveis do projeto e será necessário voltar ao 
>assunto para examinar alguns separadamente. E, também, para destacar o 
>pouco que vi de bom no projeto. Em particular, a tentativa de levar à 
>introdução dos ciclos básicos e da orientação para escolha de carreira 
>profissional nos cursos universitários, uma idéia que, entretanto, corre 
>riscos em face do modelo de gestão que o projeto pretende consagrar.
>
>Roberto Macedo, economista
>(USP), com doutorado pela
>Universidade de Harvard (EUA),
>é pesquisador da Fipe-USP e
>professor da Universidade
>Presbiteriana Mackenzie. E-mail: roberto at macedo.com
-------------- next part --------------
An HTML attachment was scrubbed...
URL: <http://listas.if.ufrj.br/pipermail/forum-prof/attachments/20050127/7008d0b8/attachment.html>


More information about the Forum-Prof mailing list