[forum-prof] Ministro que é advogado e LEITOR

Prof. Luiz Eduardo luizeduardo at pharma.ufrj.br
Thu Jan 27 17:07:48 BRST 2005


O Globo 27 Jan 05
Cartas do Leitor


Segundo Tarso

O artigo “A Constituição segundo Tarso”, de Ali Kamel (25/01), é revelador 
da real divergência de opinião que temos a respeito da Reforma do Ensino 
Superior. O que se trata, em última instância, é o seguinte: a Reforma do 
Ensino Superior deve ou não buscar cumprir os objetivos fundamentais da 
República Federativa do Brasil, inscritas no art. 3 da Constituição 
federal? A posição que Ali Kamel sustenta é que buscar cumprir aqueles 
objetivos é enquadramento e autoritarismo. Engana-se. Os objetivos 
fundamentais da República são vinculativos para qualquer ação dos agentes 
públicos, mas a mediação que transita ­ da norma constitucional até a ação 
do agente público ­ é sempre de natureza política. É o espaço da política, 
que na democracia só tem um comando absoluto: os direitos e deveres 
originários de todos os dispositivos constitucionais. Ao querer 
secundarizar o comando constitucional mais importante, que está contido nos 
princípios constitucionais, o jornalista, na verdade, quer é dizer que sua 
ideologia e sua visão da política são legítimas e as demais são 
“soviéticas” e autoritárias. Ali Kamel deveria informar-se melhor sobre a 
teoria geral do direito constitucional, verificando o que dizem, por 
exemplo, juristas como Paulo Bonavides, Joaquim Canotilho e Konrad Hesse. 
Este último diz, por exemplo: “A Constituição (...) não configura apenas 
expressão de um ser, mas também de um dever ser; ela significa mais do que 
o simples reflexo das condições fáticas de sua vigência, particularmente às 
forças sociais e políticas, procurando imprimir ordem e conformação à 
realidade política social.” (Em “A força normativa da Constituição”). Não 
estou dizendo que a sua interpretação não pode ter abrigo dentro da ordem 
constitucional democrática. A interpretação é sempre tencionada pela 
ideologia do intérprete, mais progressista ou mais conservador. O que estou 
dizendo é que a posição do MEC a respeito da Reforma do Ensino Superior é 
legítima, republicana, democrática e tem mais abrigo na Constituição 
brasileira atual do que a interpretação de Ali Kamel, que suprime o texto 
constitucional e identifica a educação como uma mercadoria qualquer. Sua 
interpretação é tão intolerante que chega até a apontar como “soviética” a 
mera relação consultiva da universidade com a sociedade. Repito: o 
sovietismo autoritário, que vem dos “poderes objetivos”, seja da economia, 
seja da burocracia, é bem mais parecido com o neoliberalismo do que com as 
teorias socialistas democráticas. O neoliberalismo extingue a força 
normativa das leis e só reconhece, sempre, uma alternativa: obedecer às 
“leis do mercado” que, na verdade, são sempre interesses de parte do 
mercado, sempre a mais poderosa.

TARSO GENRO
ministro da Educação (por e-mail, 26/1), Brasília, DF


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