RESAZ: [forum-prof] recomendo Ali Kamel
Abraham Zakon
azakon2 at globo.com
Tue Jan 13 23:54:58 BRST 2009
Artigo na pág. de Opinião de O Globo -13/01/09
Gaza
Ali Kamel
Eu acredito em eleições. E acredito que o povo sempre tem a capacidade de
julgar o que considera bom para si. Isso não quer dizer que o povo acerte
sempre: não são poucas as vezes em que a decisão mostra-se errada no futuro.
Não importa, no momento em que comparece às urnas, certo ou errado, o povo é
responsável por suas escolhas.
Por que essa conversa? Porque isso não me sai da mente quando vejo, chocado,
os bombardeios em Gaza. Em 2006, houve eleições para escolha do
primeiro-ministro palestino. Era um contexto em que os EUA clamavam pela
democratização do mundo árabe. Quando o Hamas saiu-se vitorioso, muita
gente, diante dos lamentos dos americanos, riu, dizendo algo assim: "Ora,
não queriam democracia? Agora o povo vota, escolhe o Hamas e os EUA
lamentam? Então democracia só vale quando ganham os aliados?" Na época,
escrevi que a simples presença do Hamas nas eleições mostrava que aquilo não
era uma democracia: porque democracia não é o regime em que todas as
tendências disputam o voto; democracia é o regime em que todas as tendências
que aceitam a democracia disputam o voto. Como o Hamas prega uma teocracia,
um sistema político que o aceita como legítimo aspirante ao poder não pode
ser chamado de democracia. Seja como for, tendo sido democráticas ou não,
aquelas eleições expressaram a vontade do povo: observadores internacionais
atestaram que o pleito transcorreu sem fraudes.
E o que pregava o Hamas na campanha de 2006? Antes, para entender o
linguajar, é importante lembrar que o Hamas não aceita a existência do
Estado de Israel, chamado de "Entidade Sionista". Assim, quando se refere à
"Palestina", o Hamas engloba tudo, inclusive Israel. Destaco aqui três
pontos do programa eleitoral (na disputa, o grupo deu-se o nome de "Mudança
e Reforma"): "A Palestina é uma terra árabe e muçulmana"; "O povo palestino
ainda está em processo de libertação nacional e tem o direito de usar todos
os meios para alcançar esse objetivo, inclusive a luta armada"; "Entre
outras coisas, nosso programa defende a 'Resistência' e o reforço de seu
papel para resistir à Ocupação e alcançar a liberação. A 'Mudança e Reforma'
vai também construir um cidadão palestino orgulhoso de sua religião, terra,
liberdade e dignidade; e que, por elas, esteja pronto para o sacrifício."
Deu para entender? O Hamas propôs um programa segundo o qual não há lugar
para judeus na "Palestina", o uso da luta armada deve ser reforçado para se
livrar deles, e os cidadãos comuns devem estar preparados para se sacrificar
(morrer) pela religião, pela terra, pela liberdade e pela dignidade.
Havia alternativa? Sim, apesar da ambiguidade eterna, o Fatah do presidente
Mahmoud Abbas (e, antes, de Yasser Arafat), na mesma eleição, pregava a
saída de Israel dos territórios ocupados em 1967, a criação de um Estado
Palestino com sua capital em Jerusalém e uma solução para os refugiados de
1948 com base em resoluções da ONU, uma agenda que só parece moderada porque
é comparada à do Hamas. Embora estimulasse e declarasse legítima a
resistência à ocupação, a novos assentamentos judaicos e à construção do
muro de proteção que Israel ergue entre a Cisjordânia e seu território, o
Fatah declarava expressamente: "Quando o imortal presidente Arafat anunciou
em 1988 a decisão do Conselho Nacional Palestino, reunido naquele ano, de
adotar a 'solução histórica', que se baseia no estabelecimento de um Estado
independente Palestino lado a lado com Israel, ele estava de fato declarando
que o povo palestino e suas lideranças tinham adotado a paz como uma opção
estratégica."
E qual foi a decisão dos palestinos? Num sistema eleitoral que adota o voto
distrital misto, o Hamas ganhou tanto no voto proporcional quanto nos
distritos, abocanhando 74 dos 132 assentos do Parlamento. Ou seja, diante do
desgaste de 40 anos do Fatah, e das denúncias de corrupção que pairavam
sobre o movimento, os palestinos deixaram a paz de lado e optaram pela
promessa de pureza divina e dos foguetes do Hamas. Meses depois, uma luta
interna feroz entre os dois grupos teve lugar e resultou numa divisão
territorial: o Fatah ficou com a Cisjordânia, onde a situação é de calma, e
o Hamas ficou com Gaza, de onde continuou pregando o programa aprovado pelos
eleitores: enfrentamento armado, mesmo tendo consciência do que isso
acarretaria,
Diante disso, dá para dizer que os palestinos de Gaza são inocentes vítimas
do jugo do Hamas e de uma reação desproporcional dos israelenses?
Olha, eu deploro a guerra, lamento profundamente a morte de tanta gente,
especialmente de crianças, vítimas de uma guerra de adultos. Vejo as bombas,
e fico prostrado, temendo que o bom senso nunca chegue. Mas isso não me
impede de ver que a guerra, com suas consequências, foi uma escolha
consciente também dos palestinos de Gaza. Retratá-los como despossuídos de
todo poder de influir em seus destinos não é mais uma verdade desde 2006.
Parecerá sempre simplificação qualquer coisa que se diga num espaço tão
curto, em que é preciso deixar de lado as raízes desse conflito e a trama
tão complicada que distribuiu culpa e vítimas por todos os lados. Mas não
consigo terminar este artigo sem dizer: para que haja paz, os dois lados têm
de ceder em questões tidas como inegociáveis, o apelo às armas tem de ser
abandonado, o Estado Palestino deve ser criado ao lado de Israel, cujo
direito a existir não deve ser questionado. Se isso acontecer, muitos árabes
e israelenses daquela região não se amarão, terão antipatias mútuas, mas
viverão lado a lado.
Utopia?
ALI KAMEL é jornalista
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De: forum-prof-bounces at if.ufrj.br [mailto:forum-prof-bounces at if.ufrj.br] Em
nome de Lilia Irmeli
Enviada em: terça-feira, 13 de janeiro de 2009 17:24
Para: FORUM-prof at listas.if.ufrj.br
Assunto: [forum-prof] recomendo
texto de Fritz Utzeri :
De Varsóvia a Gaza
07 de janeiro de 2009
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a-gaza
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