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Giuseppe Cocco beppo at terra.com.br
Fri Jan 9 16:58:21 BRST 2009


Para o debate



          Tempo de cínicos: os que apóiam essa guerra apóiam o horror

Gideon Levy, /Haaretz/, Televive, 9/1/2009, 3h24
http://www.haaretz.com/hasen/spages/1054158.html

Essa guerra, talvez mais que as anteriores, está expondo as veias 
profundas da sociedade de Israel. Racismo e ódio erguem a cabeça, o 
vingancismo e a sede de sangue. A "tendência do comando" no exército de 
Israel hoje é matar, "matar o mais possível", nas palavras dos 
porta-vozes militares, na televisão. E ainda que falassem dos 
combatentes do Hamás, ainda assim essa disposição seria sempre horrenda.

A fúria sem rédeas, a brutalidade é chamada de "exercitar a cautela": o 
apavorante balanço do sangue derramado – 100 palestinenses mortos a cada 
israelense morto – não levanta questões, como se Israel tivesse decidido 
que o sangue dos palestinenses vale 100 vezes menos que o sangue dos 
israelenses, o que manifesta o inerente racismo da sociedade de Israel.

Direitistas, nacionalistas, chovinistas e militaristas são o bom-tom da 
hora. Ninguém fale de humanidade e compaixão. Só na periferia ouvem-se 
vozes de protesto – desautorizadas, descartadas, em ostracismo e 
ignoradas pela imprensa –, vozes de um pequeno e bravo grupo de judeus e 
árabes.

Além disso tudo, soa também outra voz, a pior de todas. A voz dos 
cínicos e dos hipócritas. Meu colega Ari Shavit parece ser o seu mais 
eloquente porta-voz. Essa semana, Shavit escreveu nesse jornal ("Israel 
deve dobrar, triplicar, quadruplicar a assistência médica em Gaza", 
/Haaretz/, 7/1): "A ofensiva israelense em Gaza é justa (...). Só uma 
iniciativa imeditata e generosa de socorro humanitário provará que, 
apesar da guerra brutal que nos foi imposta, nos lembramos de que há 
seres humanos do outro lado."

Para Shavit, que defendeu a justeza dessa guerra e insistiu que Israel 
não poderia deixar-se derrotar, o custo moral não conta, como não conta 
o fato de que não há vitória possível em guerras injustas como essa. E, 
na mesma frase, atreve-se a falar dos "seres humanos do outro lado".

Shavit pretende que Israel mate e mate e, depois, construa hospitais de 
campanha e mande remédios para os feridos? Ele sabe que uma guerra 
contra civis desarmados, talvez os seres mais desamparados do mundo, que 
não têm para onde fugir, é e sempre será vergonhosa. Mas essa gente 
sempre quer aparecer bem. Israel bombardeará prédios residenciais e 
depois tratará os feridos e mutilados em Ichilov; Israel meterá uns 
poucos refugiados nas escolas da ONU e depois tratará os aleijados em 
Beit Lewinstein. Israel assassinará e depois chorará no funeral. Israel 
cortará ao meio mulheres e crianças, como máquinas automáticas de matar 
e, ao mesmo tempo falará de dignidade.

O problema é que nada disso jamais dará certo. Tudo isso é hipocrisia 
ultrajante, vergonhoso cinismo. Os que convocam em tom inflamado para 
mais e mais violência, sem considerar as consequências, são, de fato, os 
que mais se autoenganam e os que mais traem Israel.

Não se pode ser bom e mau, ao mesmo tempo. A única "pureza" de que 
cogitam é "matar terroristas para purificar Israel", o que significa, 
apenas, semear tragédias cada vez maiores. O que está sendo feito em 
Gaza não é desastre natural, terremoto, inundação, calamidades em que 
Israel teria o dever e o direito de estender a mão aos flagelados, 
mandar equipes de resgate, como tanto gostamos de fazer. Toda a 
desgraça, todo o horror que há hoje em Gaza foi feito por mãos humanas – 
as mãos de Israel. Quem tenha mãos sujas de sangue não pode oferecer 
ajuda. Nenhuma compaixão nasce da brutalidade.

Pois ainda há quem pretenda enganar todos todo o tempo. Matar e destruir 
indiscriminadamente e, ao mesmo tempo, fazer-se de bom, de justo, de 
homem de consciência limpa. Prosseguir na prática de crimes de guerra, 
sem a culpa que os acompanha sempre. É preciso ter sangue frio.

Quem justifica essa guerra justifica todos os crimes. Quem prega mais 
guerra e crê que haja justiça em assassinatos em massa perde o direito 
de falar de moralidade e humanidade. Não existe qualquer possibilidade 
de, ao mesmo tempo, assassinar e reabilitar aleijados. Esse tipo de 
atitude é perfeita representação das duas caras de Israel, sempre 
alertas, ao mesmo tempo: praticar qualquer crime, mas, ao mesmo tempo, 
auto-absolver-se, sentir-se imaculado aos próprios olhos. Matar, 
demolir, espalhar fome e sangue, aprisionar, humilhar – e sentir-se bom, 
sentir-se justo (sem falar em não se sentir cínico). Dessa vez, os 
senhores-da-guerra não conseguirão dar-se esses luxos.

Quem justifique essa guerra justifica todos os crimes. Quem diga que se 
trata de guerra de defesa prepare-se para suportar toda a 
responsabilidade moral pelas consequências do que faz e diz. Quem 
empurra os políticos e os militares para ainda mais guerra, saiba que 
carregará a marca de Cain estampada na testa, para sempre. Os que apoiam 
essa guerra, apoiam o horror.

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