[forum-prof] Doutores viram pó nas Universidades privadas

JOSE RIBAS VIEIRA jribas at puc-rio.br
Sat Sep 20 08:03:44 BRT 2008






Mestres viram doutores e acabam demitidos em universidades privadas
Por Jorge Félix, para o Valor, de São Paulo
19/09/2008

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A falta de mão-de-obra qualificada é uma das maiores ameaças ao
crescimento econômico, segundo alguns economistas, empresas ou mesmo o
governo. O país forma mais de 10 mil doutores por ano. No entanto, esta
elite do meio acadêmico brasileiro, cada vez mais, encontra dificuldades
para arranjar emprego, sobretudo nas universidades, responsáveis pela
preparação de profissionais de ponta, supostamente, tão exigidos pelo
mercado de trabalho. O problema ocorre, de acordo com o Sindicato dos
Docentes de Instituições de Ensino Superior (Andes), na rede privada, onde
as demissões de professores com doutorado ou livre-docência, nos últimos
cinco anos, são observadas com freqüência, logo após a obtenção do título
acadêmico. 	Ruy Baron / Valor

Ronaldo Motta, secretário de Ensino Superior do MEC, diz que o governo
ampliará a fiscalização para evitar as demissões

"Quando fui fazer a homologação da rescisão de meu contrato de trabalho no
sindicato, tive uma surpresa: encontrei quatro outros professores de
direito", relata José Cretella Neto, ex-docente da Universidade Paulista
(Unip), a maior do país em número de alunos, demitido em 2004, meses
depois de receber a livre-docência. "Dois desses colegas tinham obtido o
doutorado na USP, como eu. Um outro, na Universidade Complutense de Madri,
Espanha. Finalmente, o último, na Universidade de Nagoya, no Japão.
Perguntei o porquê de estarmos sendo dispensados e todos me deram a mesma
informação: redução de custos", conta.
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, as universidades devem
ter um terço do corpo docente formado por mestres ou doutores. Em geral,
esses professores titulados recebem um percentual a mais por hora/aula.
"Como a lei exige de forma vaga, as universidades privadas preferem ter um
terço de mestres e nenhum doutor. Preferem também especialistas com cursos
lato sensu", afirma Cretella. O professor, no entanto, faz questão de
sublinhar que as universidades cumprem a lei, mas defende que a lei
precisa mudar porque "a economia de custos das universidades para fazer
frente à concorrência" está comprometendo a qualidade do ensino superior.
"Não é a realidade", afirma Hermes Ferreira Figueiredo, presidente do
Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino
Superior do Estado de São Paulo (Semesp) e proprietário da Universidade
Cruzeiro do Sul. "Casos isolados podem dar a impressão de que há um
movimento de demissão, mas isso não é uma rotina no setor", garante.
Segundo ele, o país está formando mais doutores, as universidades privadas
estão empregando mais titulados, porém, a demanda continua inferior à
oferta desta mão-de-obra. "O número de doutores depende do programa
pedagógico de cada instituição, a universidade é como qualquer empresa, há
uma avaliação de desempenho, não publicou durante o ano, será dispensado",
diz Figueiredo.
O presidente do Andes, Ciro Teixeira Correia, discorda: "A situação é
séria e se dá pelo descontrole do governo sobre o setor privado, muitos
professores estão escondendo o título de doutorado". De acordo com ele, a
solução passa por adaptar o sistema privado às regras das universidades
públicas, onde há o regime de dedicação exclusiva. "Isso faz toda a
diferença na qualidade do ensino. O professor-horista não tem vínculo com
a universidade, esta falta de comprometimento reduz a produção de pesquisa
e sem ela o conhecimento não avança e o ensino fica pior", acredita.
Figueiredo rebate: "Uma universidade numa cidadezinha de Tiririca da Serra
não tem condição de contratar um doutor por tempo integral para pesquisar
e em nenhum lugar está escrito ou provado que um doutor é melhor professor
do que um profissional com experiência". Segundo Figueiredo, o mercado de
trabalho para doutores é "quase exclusivo" em universidades e, diante do
aumento do número de titulados, está ocorrendo uma "pressão das
corporações" pelo crescimento de vagas. Para ele, as demissões podem
ocorrer por supressão de cursos, por exemplo.
Somente uma pesquisa detalhada poderia comprovar os motivos reais. Apesar
de afirmar que as demissões têm pouca relação com os custos, Figueiredo
reconhece que a exigência por mais professores titulados aumenta as
despesas: "É fácil falar em ensino mais caro por uma mensalidade menor,
mas esta equação não fecha". Se o motivo das demissões é de difícil
aferição, as conseqüências já foram medidas. No Índice Geral de Cursos,
avaliação das instituições divulgada pelo Ministério da Educação no início
do mês, apenas 4,9% das universidades privadas receberam notas máximas (4
ou 5), sendo que as maiores do país ficaram entre as 40 piores na lista de
173 avaliadas.
O Valor consultou o site de várias universidades privadas e constatou que
poucas atendem à portaria 2.864/2005, que obriga a divulgação nominal do
corpo docente de cada curso, indicando a área de conhecimento, titulação,
qualificação profissional e regime de trabalho (inciso IV). A maioria dos
sites está preocupada em convencer o potencial aluno de que as
instituições oferecem qualificação profissional, ampliando as chances no
mercado de trabalho e nenhuma delas informa o número de alunos por turma
que, em muitos casos, passa de 100, obrigando o professor a dar aula com
microfone como em cursinhos pré-vestibular.
"Isto tudo decorre da falta de fiscalização por parte do governo", acusa
Correia. É justamente essa promessa que faz o Ministério da Educação em
resposta a onda de demissões de doutores: ampliar o cerco às instituições
privadas. O secretário de Ensino Superior do MEC, Ronaldo Motta, reconhece
que o problema "é sério", mas acredita que será evitável à medida que os
processos de regulação e supervisão tornem-se mais rigorosos, segundo ele,
como tem sido a prática recente. No caso, o próprio IGC. O índice
contempla entre suas variáveis o corpo docente, quanto à titulação
("valorizando sobremaneira os doutores") e o regime de trabalho
(identificando negativamente a presença excessiva de horistas).
Como agora a divulgação será anual, Motta garante que a tendência será de
queda na avaliação das instituições com baixo número de doutores. "Quem
agir assim, demitindo seus doutores, será certamente identificado na
avaliação institucional e será penalizado com a assinatura de um protocolo
de compromisso, tal como expresso na Lei dos Sinaes", diz, referindo-se ao
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, criado em 2004. Motta,
porém, ressalta que não há uma regra universal que aponte que todos os
professores devam ter dedicação exclusiva.
No Senado Federal, um projeto-de-lei (PL) começou a tramitar, há um ano,
para obrigar as universidades privadas a estabelecer um corpo docente
formado de, pelo menos, 25% de doutores, 50% de mestres (ou doutores) e
40% de professores em regime de trabalho em tempo integral. A agilidade na
tramitação e a aprovação do PL dependem, no entanto, da vontade do governo
de defender a idéia, pois a relatoria estava com um senador do PT, Siba
Machado, suplente da ex-ministra Marina Silva, que retornou ao cargo.
"A educação superior no Brasil tem dado passos gigantescos nos últimos
anos. Mas são passos capengas", diz Arthur Virgilio Neto (PSDB-AM), autor
do PL. "O número de cursos e alunos aumenta, mas a qualidade cai. Por que
isso ocorre? Pela massificação desacompanhada de rigor na composição do
corpo docente, o que repercute na tímida atuação das universidades
brasileiras no campo das pesquisas. É isso que pretendo corrigir",
justifica o senador. A idéia, porém, foi recebida com protestos pelas
universidades.
Até mesmo instituições que contratam um grande número de professores
titulados, como as PUCs, reagiram à criação desta obrigatoriedade legal.
Segundo o Andes, a concorrência no setor tem empurrado as universidades
tradicionais a adaptarem-se às regras de mercado. "A aprovação desta lei
seria descabida. Não é o Legislativo que deve dizer quantos doutores tem
que ter uma universidade, que não é uma concessão pública, como os meios
de comunicação, que não são obrigados a contratar só doutores em
jornalismo", compara Figueiredo.











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