[forum-prof] De Rondon a Rondon
Prof. Luiz Eduardo
luizeduardo at pharma.ufrj.br
Sat Jan 22 11:06:19 BRST 2005
At 18:15 20/1/2005, you wrote:
>De Rondon a Rondon
>
>Em 1969, juntamente com alguns colegas de colégio, todos devidamente
>monitorados pelos integrantes da pastoral da terra, tomamos o rumo de
>Rondonópolis às margens da estrada Cuiabá Porto Velho, então em
>construção. Nossa modestíssima missão era ajudar ex-garimpeiros na
>preparação para o exame supletivo, um dos muitos programas que a igreja
>católica local chefiada por Dom Pedro Casaldaglia conduzia na região,
>apesar das pressões dos militares para expulsá-lo. Ainda era possível
>encontrar vestígios da rede do telégrafo implantado pelo Marechal Rondon,
>cujo nome e fama humanista foram tomados emprestados dois anos antes pelo
>governo militar para batizar um programa social envolvendo universitários
>e populações desassistidas de regiões remotas do país. A época era de
>crescimento econômico mas também de muita repressão política e
>desigualdade social, o projeto Rondon tinha o duplo papel de mostrar uma
>face mais social do governo, assim como dar uma
>alternativa aos universitários que quisessem se demarcar do radicalismo
>da extinta UNE. Na década de oitenta o projeto foi extinto juntamente com
>outros instrumentos do período ditatorial.
>
>Quase quarenta anos depois o atual governo reedita o projeto Rondon,
>supostamente e improvavelmente a pedido da UNE ! No discurso do
>presidente uma injustiça com FHC a de que os governos anteriores não
>desenvolveram programas semelhantes - A versão social democrata do
>projeto Rondon existiu sim, chamava-se Universidade Solidária e integrava
>o pacote de ações neo assistencialistas daquele governo. Já na intervenção
>do representante estudantil uma improvável finalidade bombástica do
>projeto contrapor-se às ONGs que na Amazônia contrabandeiam nossas
>riquezas naturais... A imagem do presidente com o chapéu de legionário do
>projeto Rondon de outrora evoca coincidências impressionantes o PP ,
>núcleo duro da ex- ARENA, face civil do regime militar daquela época,
>passa a integrar a base aliada. E, Dom Pedro Casaldaglia, hoje um ancião,
>está impedido pela alta hierarquia da igreja de permanecer na região,
>aguardando seu sucessor. Isto, sem mencionar a importância que os velhos
>caciques de sempre têm neste governo. O abraço dos neo trabalhistas com as
>forças mais conservadoras do país parece-se mais com
>um abraço de afogados, reflete a inação do atual regime diante de um
>horizonte desafiador que de um lado reune poderosas corporações
>multinacionais que tudo tragam ao seu redor, e de outro, uma imensa
>população desorganizada e carente de quase tudo.
> Prof. Luis Paulo
>DME
>C.P. 68530
>21945-970 Rio de Janeiro, RJ
>braga at dme.ufrj.br
>lpbraga at gbl.com.br
Luiz Paulo,
Acho que foi em 1974, fiquei uns 40 dias em Cruzeiro do Sul, no Acre, no
Campus Avançado da UNICAMP, vestindo aquela camisetinha amarelada do
Projeto Rondon, sem ter muito o que fazer, além de jogar volley no Batalhão
do Exército, com os oficiais, às 4 da tarde, almoçar salsicha em
lata, raspar a barba porque apareceu piolho, tirar bicho de pé e ouvir
meus colegas de Odonto relatarem sobre as dezenas de dentes que eles
arrancavam por dia, todo dia.
Tinha Copa do Mundo, mas não tinha como acompanhar, porque naquela cidade,
a segunda mais importante daquele Estado, não pegava estação de rádio com
os jogos. Os resultados a gente ficava sabendo, muito depois, por alguma
rádio peruana, que também pegava mal, muito mal.
Sem nenhuma orientação, comecei a realizar um levantamento sobre o
agribusiness local.
Tinha uma fábrica de refrigerante, financiada com dinheiro da SUDAM, que
pagava a molecada pra catar tampinha velha, pelo chão dos bares e pela rua,
pra reutilizar, já que não conseguia comprar tampinha nova. O guaraná deles
vinha com tampinha de cerveja, de coca-cola, de fanta... e não vedava
suficientemente, perdendo gas, o que limitava a validade do produto a
algumas horas apenas, e então ele tinha que entregar nos bares todos os
dias, pro bagulho ser vendido antes do meio da tarde.
Havia mais umas dez agroindustrias lá, desse tipo, incluindo sorvetes e
coisas assim, todas em situação pior que a de refrigerantes, a maior parte
delas fechada, inoperante, com o empresário tendo desviado o dinheiro pra
outras finalidades, como aquisição de caminhões, por exemplo, ou carros e
bens para a casa.
Eu não tinha idade nem formação pra fazer um trabalho desses.
Pra me intrometer nessa questão.
Se o Governo consegue fazer chegar dinheiro lá... deveria ter também como
fazer chegar orientação técnica e monitoramento.
Mesmo assim chegamos a organizar uma reunião com todos os empresários, à
noite, para delinear alternativas de recuperação dos investimentos.
Isso bagunçou a cidade.
Também criei lá um programa na rádio local, de informação em saúde e
música. Ouvintes telefonavam pra responder sobre assuntos "ensinados" na
tarde anterior. E concorriam a um jantar no Campus. A comida era péssima,
mas as garotas locais queriam muito conversar com os rondonianos, né ?
Para mim, pessoalmente, fui um aprendizado bastante bom.
Era a segunda vez que ia à Amazonia: a primeira havia sido uma viagem de
navio, dois anos antes, como prêmio de um concurso de monografias sobre
"Recursos Aquáticos".
Para a população local, tudo que restou foram dentes a menos.
Em tudo a minha experiencia coincide com a do Luiz Paulo.
Não são opiniões ou paixões.
São relatos de experiências vividas.
Apenas acho que o Luiz Paulo esqueceu de incluir, no final, que não são
apenas as multinacionais. Existe, muito pior que elas, e além ainda dos
grupos do mercado financeiro, papelento em vez de empreendedor, um vasto
grupo de empresarios nacionais predadores, destruindo toda a estruturação
produtiva. Mas isso já é outro assunto.
Bom sábado.
Luiz Eduardo R. de Carvalho
www.ufrj.br/consumo
luizeduardo at ufrj.br
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