<p>Felipe,</p>
<p>Toda a vez que um sistema prioriza uma forma específica de produtividade, exarcebando a competição e a acumulação, na mesma medida em que são forçados consensos goela abaixo, a tendência é no sentido do claro totalitarismo, seja de corte fascista, stalinista ou de mercado capitalista.</p>
<p>Evidentemente essas tendências não seguem os mesmos procedimentos do período entre guerras.</p>
<p>Devidamente atualizadas, elas até flertam firme com a persuasão e a democracia, mas praticam mesmo no final das contas, o discurso único ou o famoso <em>there is no alternative</em>.</p>
<p>Daí as expressões neofascismo, o extremismoa à direita, que podem ser também extremas à esquerda, como o neostalinismo, sem deixar de lado o simulacro da liberdade e da democracia, mais conhecido como neoliberalismo.</p>
<p>Tradicionalmente os cientistas prestam grandes serviços a esses sistemas, mais ou menos como os antigos sacerdotes dos faraós, sendo que ao invés de prometer o domínio através de poderes metafísicos, invocam a racionalidade insuperável da tecnociência, com a qual municiam o poder político para que os seus detentores sintam-se emponderados para atropelarem qualquer debate, diferença ou dissenso.</p>
<p>Foi assim nos regimes totalitários da Alemanha, do Japão, da URSS e até nos Estados Unidos, com o Consenso de Washington e a Era Bush.</p>
<p>O resultado é uma universidade que não debate o que deveria debater, que quer produzir o conhecimento, mas não quer refletir sobre o seu impacto, que se declara preocupada com a graduação, mas aposta na massificação do REUNI - o rato parido da montanha de areia chamada Plano Nacional de Educação, que de plano nada tinha -, que se diz amante da interdisciplinaridade, mas privilegia a pesquisa aplicada e deixa encravar em seu campus um monstrengo petrolífero como não se vê em nenhuma outra parte do mundo, que não sabe mais se a COPPE é ou não pertencente à sua realidade institucional, e que finalmente não formula consensos substantivos de educação e civilização, reverberando-os claramente por toda a sociedade.</p>
<p>É nesse contexto de acanhamento político e acadêmico, que são determinados quais são os professores "produtivos" e os "não-produtivos". Que podemos também denominar como sendo "competentes" ou "incompetentes" ou melhor ainda, <em>winners and losers</em>.</p>
<p>Concordo plenamente quando você propõe a necessidade de desenvolvermos melhor diversos indicadores, para que a avaliação de desempenho acadêmico seja mais completa e menos injusta.</p>
<p>E concordo igualmente que a dificuldade nesse sentido não é pequena. A esse respeito os problemas que você levantou são também mais do que pertinentes.</p>
<p>Mas à guisa de refletirmos e pensarmos (somos pagos para isso também), sobre os princípios norteadores desses indicadores, gostaria de acrescentar que devemos valorizar mais as estimativas do que as comparações, e que o parecer qualificado dos alunos tem de ser parte integrante desse conjunto de indicadores.</p>
<p>Afinal, a sociedade que nos paga encontra-se representada com todas as suas desigualdades e eventuais virtudes, pelos alunos com os quais precisamos trabalhar.</p>
<p>Frequentemente isso parece sobremaneira distante dos nossos mais acalorados debates.</p>
<p>Talvez por isso, a nossa UFRJ não seja também uma universidade orientada para os seus alunos.</p>
<p>Abraço,</p>
<p>Leandro</p>
<p><br />Em 15/01/2010 15:54, <strong>Luiz Felipe Coelho < coelho@if.ufrj.br ></strong> escreveu:</p>
<blockquote style="border-left: 2px solid #6868cc; margin: 0pt 0pt 0pt 0.8ex; padding-left: 1ex;"><br /> Pessoal<br /><br /> Qualquer indicador se presta a distorções: números de horas de aula semanais (CDSM), número de artigos cientícos, número de orientados, número de citações, número de patentes, número de cargos administrativos, etc, etc, etc. Isso acontece na pós, na produção científica, na graduação, na administração e na extensão. Mas indicadores são males necessários!<br /><br /> Para mim a resposta a tudo isso é que temos a necessidade de indicadores, para que as atividades acadêmicas funcionem e em respeito ao apoio que a sociedade nos dá, e temos a necessidade de nos relacionarmos de forma civilizada e prazeirosa, não estamos numa linha de montagem do Henry Ford. As duas necessidades tem um equilíbrio instável. A meu ver adjetivos como "neofacista" são equivocados inteiramente, cobrar produtividade dentro da universidade nunca pode ser
chamado de neofascista. O fascismo é um movimento autoritário baseado num partido político de massas e que visa a governar um país em benefício de suas elites. O Qualis, a CAPES, o CNPq, o Lattes e outros nomes e siglas, por piores que sejam seus defeitos eventuais, não visam a isso, os cientistas (nem mesmo o ministro e físico Sérgio Rezende) não querem tomar o poder em Brasília!<br /><br /> Abraços, Felipe<br /><br /> PS: Exemplos da necessidade e da dificuldade de indicadores:<br /> No caso da pós a qualificação dada pela CAPES depende de uma batelada desses indicadores dividida pelo número de docentes do programa. Aí é natural que os programas tentem separar os docentes inativos. Como não há regra para isso alguns programas são extremamente restritivos, com docentes supostos, certa ou erradamente, serem "pouco produtivos" sendo afastados para "melhorar os indicadores", o que leva a um ganho coletivo de ter mais bolsas. A meu ver é natural a CAPES ter
indicadores mas ela tem que impedir que os programas "trambiquem" esses indicadores com um corte artificial de seu quadro docente.<br /><br /> No caso da produção científica, esta desde sempre envolveu divulgação dos resultados para submissão aos colegas ou oralmente (em congressos ou em reuniões científicas) ou por escrito (em artigos e livros). A medição disto é complicadíssima mesmo nas ciências da natureza e suas aplicações pois há diferenças dramáticas de área para área (em física de partículas experimental por exemplo é frequente artigos com mais de 100 autores, pois as experiências são extremamente complexas e demoradas, já nas outras áreas da física o normal é ter 2 ou 3 autores) e há intercessão de áreas. A medição é muito mais difícil para ciências humanas e sociais e para artes. <br /><br /> No caso da atividade didática de graduação, medí-la pelo número de horas de aula, pelo número de alunos matriculados, pela diversid
ade de disciplinas ministradas, pelo número de orientados acadêmicos, ou pela preparação de livros? Mas quem garante que os livros escritos e as aulas ministradas foram bons, que as provas foram corrigidas cuidadosamente, que os alunos foram bem orientados ou que alunos com dúvidas extra-classe foram bem atendidos? Além disso o que é uma aula, um profissional de saúde que fica 20 horas num hospital, algumas das quais na presença de alunos, será que deu 20 horas de aula? E uma turma, se uma turma de 20 alunos for subdividida em 2 turmas de 10 o trabalho docente dobra?<br /><br /> O mesmo vale para a administração, alguns professores tiveram muitos cargos administrativos mas quem garante o seu desempenho?<br /><br /> O caso da extensão é para mim o mais difícil de medir, como comparar uma apresentação de orquestra com um curso de qualificação de professores? <br /><br /> <br /></blockquote>