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<div align="center"><font size=4><b>Meus Colegas Cientistas e suas
Maquinas Publicadoras<br><br>
</b></font></div>
Em 1974, a UNICAMP contratava recem-graduados, sem concurso, e de
imediato já os enviava para fazer mestrado e doutorado em Davies, na
Califórnia.<br><br>
Em 1975, recem-graduado na engenharia de alimentos da UNICAMP, fui o
primeiro colocado na seleção do Mestrado.<br><br>
Isso não tem mérito nenhum.<br><br>
Eu sabia muito bem que tipo de decoreba aqueles "cientistas"
iriam perguntar na prova escrita.<br>
Com certeza iriam mandar colocar no papel o Ciclo de Krebs, ou da
Pentose-Fosfato, e seus compostos intermediários, todos, pela ordem.<br>
Ok, eles não pediram isso.<br>
Mas pediram todas as enzimas envolvidas no processo (pela ordem).<br>
Eu tinha decorado tudo isso e muito mais.<br>
Sei muito bem respeitar as regras do jogo.<br>
Enquanto estiver jogando.<br>
Enquanto estiver em idade de jogar.<br>
Até me tornar um adulto professor.<br>
Agora... sinto muito, mas agora o jogo acabou.<br>
Eu tenho apenas esta vida.<br>
Não posso jogá-la no lixo, submetê-la às ordens dos
mortos-vivos.<br><br>
Eu vejo o que meus colegas-cientistas publicam.<br>
Aquilo não pode ser jogado no lixo.<br>
Aquilo é pior que lixo hospitalar.<br>
Aquilo é pior que pilhas e baterias usadas.<br>
Aquilo não pode ser despejado em qualquer lata de lixo.<br>
Falemos sério.<br><br>
Minha tese de mestrado era pra ser no que se publicava na época: mistura
de farinhas para recombinar os aminoácidos essenciais, otimizando o valor
biológico, compensando a falta de lisina do milho e a carencia de
metionina da soja, fazendo uma farinha mista pros pobres comerem.<br>
A universidade, como vemos, já defendeu porcarias mais sofisticadas que o
Bolsa-Família.<br><br>
Fiz muitos experimentos.<br>
E mesmo publiquei muitas dessas porcarias, enquanto humilde e subalterno
APRENDIZ.<br>
Desidratei polpa de goiaba, em secadores de tambor aquecido, tudo
misturado com muita soja.<br>
Botei rato pra comer.<br>
Pesei rato, medi rato, humilhei ratos e poderia ser hoje um campeão de
alpinismo lattesiano.<br><br>
Na boiada já fui boi, mas um dia me montei.<br>
Não vou ficar fazendo isso que leio nas revistas: contando, com
barômetros ou não, quantos coliformes fecais, ou quantas microgramas de
mercúrio existem nos mariscos pescados em Saquarema.<br>
Não vou ficar colecionando publicações desse tipo.<br>
Isso não é ciencia.<br>
Isso é vulgar burocracia de laboratório.<br>
Isso pode ser feito por qualquer alunos de nível médio.<br>
Isso é trabalho de rotina nos miseráveis laboratórios oficiais de saúde
pública.<br>
Isso não é ciencia.<br>
Nada disso é ciencia.<br><br>
Mas é isso que eu vejo meus colegas cientistas publicando inutilmente,
banalmente, burocraticamente, mariavaicomasoutrasmente.<br><br>
Das farinhas mistas, dos produtos de soja salvadores da fome e da
miséria, passando pela contagem de contaminantes e micróbios, agora
entraram nessa charlatanice de alimentos funcionais.<br><br>
Um desqualificado e imoral cientista da Unicamp aparece no Jornal
Nacional, da TV Globo, anunciando a Tabela de Composição de Alimentos
Brasileiros, a grande contribuição unicampiana para a nutrição
brasileira. E dá o exemplo da feijoada. Diz que a tabela da USDA não
informa quanto tem de proteína no sarapatel, no cururu, no vatapá, no pão
de queijo, no calango, no angu do Gomes e na feijoada. <br><br>
Se eu fosse dono da UNICAMP eu botava o cara na rua no dia seguinte, por
justa causa, porque um imbecil desses só pode prejudicar a imagem da
instituição junto ao público.<br><br>
Falemos sério: cada feijoada tem uma composição diferente.<br>
Aliás, cada concha, da mesma feijoada, tem um percentual proteico
totalmente diferente, porque um pega carne seca, outro pega muito caldo,
outro opta pela orelhinha do porco...<br>
como é que um publicador daqueles me publica uma porcaria dessas em
público ?<br><br>
Mas tudo isso não é exclusivo das ciências de alimentos.<br>
Na Nutrição a gente assiste a mesma coisa, com esse negócio de pesar e
medir gente, de tirar sangue de crianças famintas, em filas de hospitais
públicos, pra saber se no sangue tem vitamina A e ferro suficientes...
pra nem falar nas teses e publicações sugerindo que os pobres comam bifes
de casca de abacaxi e sopa de casca de ovo... enquanto o cientista come o
abacaxi e o ovo.<br><br>
Foi desse ambiente aí que eu vim.<br>
Foi nesse ambiente científico aí que me formei.<br>
Estava deixando pra publicar sobre isso mais pra frente, quando estivesse
menos ocupado com a agenda de professor.<br><br>
Parece, porém, que vou ter que escrever sobre isso logo-logo.<br><br>
Não vai ser bom pra universidade.<br>
Não vai ser bom pra ciencia.<br>
Não vai ser bom pra nenhum de nós.<br><br>
A gente podia deixar esse pessoal em paz, publicando essas bobagens, se
eles ficassem na deles.<br>
Até aí... ainda dava pra tolerar.<br><br>
Mas quando eles estão tentando e conseguindo impor hegemonicamente essa
vertente obscena da ciência, sinto muito, vamos ter que iluminar e
discutir os fatos.<br><br>
L.E.</body>
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